31 de mai. de 2006

A propriedade intelectual levada a sério

Quase a metade das patentes da Unicampfoi requerida nos últimos três anos, com a criação da Inova
Por: CLAYTON LEVY
Jornal da Unicamp

Os números já chamam a atenção de especialistas internacionais. Em três anos de trabalho, a Agência de Inovação (Inova) levou a Unicamp a assinar 23 contratos de licenciamento, que envolvem mais de 40 patentes. O mais recente deles, assinado pelo reitor José Tadeu Jorge no dia 2 de outubro, envolve o laboratório Aché, o maior de capital nacional do país, que investirá R$ 2 milhões para levar uma droga desenvolvida pelo professor e pesquisador Lício Velloso, da Faculdade de Ciências Médicas, a possivelmente se tornar um medicamento inédito para quem tem diabetes tipo 2.

Lidar com patentes não é algo novo para a Unicamp. Desde 1984, quando a Unicamp protocolizou sua primeira patente, de uma tecnologia desenvolvida pelo pesquisador Aruy Marotta, do Instituto de Física Gleb Wataghin, teve início o processo que faria da Universidade a instituição de ensino e pesquisa brasileira mais identificada com a cultura de inovação tecnológica. Somente a partir de 2003, porém, com a criação da Inova, é que a atividade deu um salto qualitativo, como resultado de uma estrutura montada para cuidar especificamente dessa questão. Das 447 patentes requeridas ou concedidas pela Unicamp, considerando-se apenas as que ainda estão em vigor, cerca de 200 foram pedidas nos últimos três anos. Só no ano passado foram depositadas 66 patentes – um recorde nacional – enquanto até outubro desse ano já haviam sido depositadas outras 42. E do total de patentes requeridas e ainda vigentes até agora, 48 foram concedidas.

Claro que os números ainda estão longe das marcas alcançadas por instituições internacionais de ponta, como o Massachusetts Instituto of Tecnology (MIT), nos EUA, que há mais de um século dedica-se a patentear os inventos de seus pesquisadores. Entretanto, levando-se em conta o fato de a Inova ter apenas três anos de existência, os resultados alcançados até agora não deixam de refletir um bom começo. Principalmente no contexto de um país que está apenas engatinhando quando o assunto é inovação tecnológica.

É importante salientar que o reduzido número de patentes concedidas se deve ao longo tempo de análise dos pedidos no Instituto Nacional de Propriedade Industrial (Inpi). A lentidão, no entanto, não tem sido um fator limitante no licenciamento de patentes. A experiência internacional demonstra que organizações estabelecidas com o objetivo de apoiar a transferência de tecnologias de universidades são bem sucedidas quando podem contar com quantidade e qualidade de criações patenteáveis em sua instituição matriz. A Unicamp, segundo a direção da Inova, possui estas duas características, o que propicia à Agência a obtenção de resultados expressivos na transferência de tecnologia da universidade para a sociedade.

Além das patentes, a Inova também trabalha para proteger softwares desenvolvidos por pesquisadores da Universidade. Em 2005, a Unicamp requereu nove registros de programas de computador. O desempenho naquele período foi superior ao obtido em anos anteriores ao início de atividades da Inova, mas inferior aos 12 registros computados em 2004. Não obstante a importância do registro, este constitui uma proteção limitada, quando comparada com a proteção oferecida por uma patente de invenção, uma vez que o código fonte não pode ser protegido por patente no Brasil. O registro de programa de computador confere a proteção de direito autoral apenas ao descritivo documentado, mas não inclui seus equivalentes funcionais, como ocorre no caso de uma invenção protegida por patente. Ainda assim, a Inova dedica à efetivação desses registros empenho igual ao dedicado ao depósito de patentes.

Por trás desses resultados está uma equipe de quinze profissionais liderados pela diretora de parcerias e propriedade intelectual, Rosana Ceron Di Giorgio. Cabe a ela coordenar a interface universidade-empresa quando o assunto é propriedade intelectual. Não se trata de algo trivial. Mais do que simplesmente requerer uma patente junto ao INPI, a equipe busca protegê-la de todas as formas, a fim de torná-la forte. A equipe empenha-se, também, na disseminação, junto à comunidade da Unicamp, de uma cultura que valorize e apóie todas as formas de proteção da propriedade intelectual da Universidade.

Patente forte – Uma patente forte, segundo Rosana, tem características bem definidas. Apresenta boa redação e boa análise técnica. O inventor deve deixar bem claro tudo o que já existe (estado da técnica) e qual é a novidade (estado da arte) da tecnologia que está sendo oferecida. Os claims (as reivindicações) devem estar bem explicitados. A redação deve ser abrangente e cobrir possíveis tecnologias de terceiros também. Além disso, a patente deve apresentar solução para um problema para o qual exista demanda de mercado, de forma aperfeiçoada e vantajosa em relação às soluções já disponíveis.

Para atender a este padrão de qualidade, o pedido de patente é submetido a um processo que compreende três fases: busca de anterioridade, avaliação comercial e formulação do pedido propriamente dito. Na primeira fase, a equipe realiza um detalhado levantamento sobre tudo o que já foi produzido na área do invento a fim de verificar se é inédito ou não. Na segunda fase, um comitê interno passa a analisar todas as aplicações possíveis do invento a fim de garantir uma proteção o mais abrangente possível. Na terceira fase, consolida-se o pedido para posterior protocolo no INPI, com base nos dados levantados nas duas fases anteriores. Todo o processo dura de 45 a 60 dias.

Basicamente, um pedido de patente se divide em dois fatores: o relatório descritivo e as reivindicações. O relatório é um suporte teórico no qual o pesquisador descreve a tecnologia desenvolvida. As reivindicações são os aspectos que se pretende proteger do ponto de vista jurídico e comercial. “É isso que, no futuro, um juiz poderá usar para analisar se a patente está ou não sendo copiada”, explica o assessor técnico em propriedade intelectual, Rodrigo Guerra Moura e Silva. “Tem de estar bem explicitado para evitar infiltração de um eventual concorrente”, completa o assessor, que antes de ingressar na Inova, trabalhou no INPI como examinador de patentes.

O fato de o trabalho estar sendo realizado por uma equipe comprometida com a Universidade também determina um diferencial importante. Antes da Inova, o pesquisador mandava o relatório para escritórios externos, que nem sempre davam a atenção necessária às reivindicações. “Com esse trabalho, a transferência da tecnologia é feita de forma mais segura”, garante o assessor técnico Ciro de la Cerda, com a experiência de quem lida com patentes na Unicamp desde 1994. “A empresa que pretende investir nessa tecnologia terá a certeza de que será remunerada porque o produto estará protegido no mercado”.

O mesmo rigor qualitativo é aplicado na hora de negociar as patentes com as empresas. Nesse aspecto, o diferencial determinado pela equipe da Inova se resumem a duas palavras: formalidade e agilidade. “Os contratos são claros e o acordo de confidencialidade é seguido à risca”, diz Vera Crósta, que atua na área de Desenvolvimento de Parcerias com empresas do setor farmacêutico, químico e alimentício. “A empresa começa a trabalhar com a Inova Unicamp sabendo o que esperar do começo ao fim do processo”.

Agilidade – Nesse momento, a Unicamp está negociando o licenciamento de aproximadamente 60 tecnologias. Uma equipe de seis profissionais dedicam-se exclusivamente a esse trabalho. Na avaliação deles, se 10% ou 15% forem licenciadas, já terá sido um êxito significativo. Além das tecnologias já desenvolvidas, as negociações também envolvem encomendas do mercado. “As empresas recorrem freqüentemente à Unicamp para obter tecnologias que ainda não foram desenvolvidas”, diz o assessor técnico para tecnologia da informação, Uéber Fernandes Rosário. “Tanto é que firmamos convênios antes do desenvolvimento da tecnologia”.

Segundo os integrantes da equipe, um dos fatores para a agilidade nas negociações é o perfeito entrosamento entre a Inova e a Procuradoria Geral da Universidade. “Nas negociações com as empresas participam integrantes destes setores de ambos os lados”, observa Vera Crósta. A equipe da Inova acredita que o trabalho realizado está contribuindo para criar uma cultura que enxergue na inovação científica e tecnológica um fator estratégico para o desenvolvimento nacional. “Antes as patentes ficavam na prateleira da universidade, agora estão sendo transferidas para a prateleira do mercado”, conclui Vera Crósta.

SERVIÇO
Fone: (19) 3521-5201/ Fax: (19) 3521-5210
http://www.inova.unicamp.br/contato

*Reportagem originalmente publicada no JORNAL DA UNICAMP. Edição 342 -30 de outubro a 12 de novembro de 2006. Foto: Antoninho Perri.

30 de mai. de 2006

Unicamp e Aché testam nova droga contra diabetes

Por: Jeverson Barbieri
Jornal da Unicamp

A Unicamp e a Aché Laboratórios Farmacêuticos assinaram na tarde de hoje, na sala do Conselho Universitário (Consu), contrato de licenciamento para o desenvolvimento de um novo medicamento sintético indicado para o diabetes melitus (tipo 2). A pesquisa, que está em fase inicial, foi desenvolvida pelo professor e pesquisador da Faculdade de Ciências Médicas (FCM), Licio Velloso.

A Ache investirá R$ 2 milhões nessa fase, que deverá durar cerca de três anos.
A pesquisa de Velloso está focada em um composto desenvolvido no Laboratório de Sinalização Celular da FCM, cujas propriedades alteram uma molécula de DNA, bloqueando uma proteína que atua na regulação do metabolismo. Segundo ele, esse composto melhora a produção de insulina, principalmente nos tecidos periféricos. A parceria, considerada rara em termos de Brasil, foi uma iniciativa do Instituto Uniemp e teve participação fundamental da Agência de Inovação da Unicamp (Inova).

Na primeira etapa da pesquisa, serão avaliados os efeitos do composto sobre a secreção e a ação da insulina. Serão realizados, ainda, testes toxicológicos e de biodisponibilidade. Em uma outra fase, o composto será comparado a outras drogas já em uso para o tratamento do diabetes melitus em humanos para a comprovação de sua eficácia.

Licio explicou que ao longo dos anos é possível observar um aumento da prevalência desse tipo de diabetes, que já atinge de 10 a 12% da população brasileira. Segundo ele, esse tipo de diabetes é proveniente principalmente da má-alimentação, da obesidade e da inatividade física. "Isso reduz a expectativa de vida através do aumento das doenças vasculares, renais e oftalmológicas", ressaltou.

A droga já foi testada em camundongos com diabetes e os resultados comprovaram a sua eficácia. De acordo com o pesquisador, "é importante que a indústria farmacêutica nacional invista em projetos de P&D desde seu início. Essa parceria fornecerá os subsídios necessários para a continuidade do projeto".

Para o diretor presidente da Inova, Roberto Lotufo, essa é uma parceria importante e arrojada para ambas as partes. "Ela é fruto de um investimento significativo tanto da Unicamp quanto da Aché". Disse. Já o diretor executivo de estratégia e desenvolvimento da Ache, José Ricardo Mendes da Silva, observou que a parceria insere o laboratório em uma almejada linha de produção de sintéticos.

José Roberto Lazarini, diretor médico-científico da Aché, disse que a expectativa é que o composto desenvolvido melhore a produção de insulina e também a sua ação. "Nenhuma outra droga encontrada no mercado para diabetes melitus é capaz de ter as duas ações simultaneamente e, por isso, a grande inovação que o medicamento promete", explica.

O reitor da Unicamp, José Tadeu Jorge, afirmou que o contrato é fruto do modelo adotado pela universidade. "A pesquisa realizada aqui gera conhecimento novo que é, conseqüentemente, passada aos alunos. Isso ajuda a formar recursos humanos qualificados", concluiu.

*Reportagem originalmente publicada em: http://www.unicamp.br/unicamp/divulgacao/2006/10/02/unicamp-e-ache-testam-nova-droga-contra-diabetes

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