4 de jun. de 2007

Exclusividade na Lei de Inovação

Em 26 dias, Federal de São Carlos faz primeiro licenciamento nosmoldes da Lei de Inovação; e Unicamp assina primeiro contrato
Por: Mônica Teixeira e Rachel Bueno

Em 13 de fevereiro de 2007, a Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) licenciou sua patente de um biorreator, com exclusividade, para a empresa Tecnal Equipamentos para Laboratórios. Ao contrário do que informou Inovação na edição passada, é provavelmente este o primeiro licenciamento exclusivo negociado por uma universidade pública de acordo com o cânone da Lei de Inovação. O equipamento foi desenvolvido por professores do Departamento de Engenharia Química. A empresa que licenciou a patente está no mercado desde 1976, tem sede em Piracicaba (SP) e especializou-se em fornecer material para laboratórios de empresas e universidades. A patente e seu licenciamento

A patente licenciada, PI0404703-6, foi depositada no Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI) em julho de 2004. Ana Lúcia Vitale Torkomian, diretora da Fundação de Apoio Institucional ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FAI), que cuida da propriedade intelectual da universidade, conta que todos os passos da Lei de Inovação foram seguidos. No dia 19 de janeiro de 2007, o "aviso de seleção para licenciamento com exclusividade" — o edital prescrito na nova legislação para a escolha da empresa — foi publicado no Diário Oficial da União.

O prazo para abertura de envelopes com propostas foi fixado para 1º de fevereiro — 15 dias depois da assinatura do edital, feita em 16 de janeiro. "Como a regulamentação da Lei de Inovação não estipula o prazo para a manifestação das empresas, escolhemos 15 dias, que é o prazo utilizado na Lei de Licitações", explica Ana Lúcia. Só a Tecnal se apresentou. No dia 8 de fevereiro, o Diário Oficial publicou o resultado do julgamento; já no dia 13, universidade e empresa assinaram o contrato de licenciamento exclusivo.

Em 26 dias, o assunto estava resolvido: a empresa tem o direito de exploração da patente por dez anos; o contrato prevê um período de um ano para cooperação técnica entre empresa e inventores, com a finalidade de deixar o biorreator pronto para industrialização e comercialização. Os royalties serão de 12,5% sobre o faturamento líquido. "Foi uma boa negociação", reconhece a gestora. "A empresa vai investir muito pouco antes de a comercialização começar."

A política da UFSCar
Antes que a FAI encaminhe ao INPI o depósito de um pedido de patente, conta a diretora, há uma análise de seu potencial de comercialização, por meio de um estudo de mercado e da busca de empresas interessadas. "Com o biorreator não foi diferente", contou a diretora. Como a viabilidade comercial ficou clara, depois dessas diligências, o processo de patenteamento começou. Houve conversas com duas empresas, lembra-se Ana Lúcia, entre elas a Tecnal — "uma empresa nacional, o que nos agrada", completa.

A universidade já fez cinco licenciamentos; no momento, há um edital aberto. Como habitualmente, houve contatos com empresas para prospecção de interesse, prévios ao edital; neste caso atual, com três empresas. "O licenciamento não se dá de fato pelo edital. O processo de negociação é de muita conversa, de convencimento, de mostrar os detalhes da tecnologia. O edital, no caso da exclusividade, serve para sabermos se há mais alguma empresa interessada, que poderá oferecer melhores condições", conta.

Ana Lúcia enfatiza que esse procedimento de negociação é diferente do procedimento para compra de material, por exemplo. "Não é simplesmente por meio de um edital que vamos conseguir mostrar uma tecnologia para uma empresa." Para ela, o edital para licenciamento exclusivo legitima o trabalho dos escritórios de transferência de tecnologia. "Não é a publicação do edital que leva ao licenciamento."

As empresas e o licenciamento exclusivo
Na experiência da gestora, as empresas preferem sem dúvida o licenciamento exclusivo. Os outros quatro licenciamentos já realizados, também exclusivos, foram feitos antes da entrada em vigor da Lei de Inovação. "O entendimento da procuradoria jurídica da universidade era de que o licenciamento, mesmo exclusivo, não requeria procedimento licitatório", esclarece. A empresa com quem a FAI alcançasse a melhor negociação era a escolhida.

Para ela, a exigência de edital não é um entrave — embora assim parecesse aos escritórios de transferência de tecnologia quando a regulamentação foi editada. "O edital é uma tranqüilidade", avalia. "Ficamos inseguros no começo por causa da falta de uma diretriz mais detalhada na legislação", completa. "O edital pode fazer surgir empresas que ofereçam melhores condições."

As empresas reclamam da publicidade envolvida no edital para o licenciamento exclusivo? "Pode ser uma barreira inicial, mas não é instransponível", opina Ana Lúcia, que é engenheira de produção e doutora em administração pela Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da Universidade de São Paulo (FEA-USP). "Por outro lado, as empresas ganham muito quando associam seu nome com a universidade. Dessa publicidade, elas fazem questão."

Todos os licenciamentos já geraram receitas, pois previam etapas de cooperação técnica para escalonamento das tecnologias. "A compra de equipamentos para um laboratório foi um exemplo", conta Ana Lúcia. Receitas de royalties, até agora, a universidade obteve somente da exploração de cultivares. "Faz só três anos que iniciamos esse trabalho. Ainda não deu tempo", finaliza.

A assinatura do primeiro contrato de licenciamento exclusivo da Unicamp
A Unicamp e a empresa Incrementha PD&I assinaram no dia 28 de maio o contrato de licenciamento da patente "Formulação de Medicamento na Forma de Colírio de Insulina para Olho Seco", noticiado na última edição de Inovação. A cerimônia aconteceu na sala do Conselho Universitário (Consu), no campus da Unicamp em Campinas (SP). O vice-reitor da universidade, Fernando Ferreira Costa, representou o reitor José Tadeu Jorge, que não pôde comparecer.

Em sua fala, Fernando ressaltou o fato de a patente em questão ter sido gerada a partir de uma pesquisa multidisciplinar — entre os seis inventores há pessoas ligadas às áreas de endocrinologia e oftalmologia da Faculdade de Ciências Médicas (FCM) e também ao Instituto de Biologia (IB). "Um conjunto de competências se uniu para responder a algumas questões formuladas pela criatividade de um aluno de pós-graduação", declarou.

O aluno a quem ele se referiu é o médico Eduardo Melani Rocha, autor da tese de doutorado que serviu de base para a pesquisa. Hoje professor da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (FMRP) da USP, Melani elogiou o trabalho da Agência de Inovação da Unicamp (Inova Unicamp), órgão responsável pela propriedade intelectual da universidade: "O ambiente foi muito favorável. A Inova passou a nos dar apoio e a guiar a transformação do conhecimento científico em tecnologia", disse.

Como se tratava de um licenciamento exclusivo, a Inova cumpriu a exigência da Lei de Inovação e publicou um edital para selecionar a empresa que exploraria a patente. Foi a primeira vez que a agência fez isso desde a regulamentação da lei, em outubro de 2005. Segundo seu diretor-executivo, Roberto Lotufo, a Inova teve dificuldades para fechar contratos de licenciamento no ano passado — foram apenas dois, contra 12 em 2005 e 10 em 2004 —, mas já está se adaptando à nova legislação.

O acordo com a Incrementha foi o segundo de 2007 — o primeiro, com a BioCamp, saiu em abril e não envolve exclusividade. A empresa, criada pela Biolab em parceira com a Eurofarma, espera poder comercializar o colírio daqui a cinco anos. Se as vendas forem inferiores a R$ 15 milhões, terá de pagar 4% do valor à Unicamp; se ultrapassarem esse limite, os royalties caem para 2%.

Dante Alário Júnior, diretor técnico-científico da Biolab, está animado: ele acredita que o produto poderá chegar ao mercado antes do tempo previsto, pois a insulina, presente no colírio, já é uma droga conhecida e, portanto, não precisa passar por testes de toxicologia. Durante a cerimônia de assinatura do contrato, Dante falou sobre o estreito relacionamento da Incrementha com a academia e manifestou o interesse da empresa em fazer outros acordos com a Unicamp. "Há excelentes tecnologias na universidade. Basta que a indústria arregace as mangas e as transforme em produto", afirmou.

O professor Licio Velloso, da FCM, também participou da solenidade. Ele foi o orientador da tese de doutorado de Eduardo Melani e faz parte da lista de inventores da patente. Além dela, Licio
tem mais uma — já licenciada. O acordo foi feito no ano passado com o laboratório Aché.

*Reportagem originalmente publicada em: http://www.inovacao.unicamp.br/report/noticias/index.php?cod=101

30 de mai. de 2007

Colírio à base de insulina chega à indústria

Contrato de licenciamento de tecnologia desenvolvida por pesquisadores da Unicamp é assinado dia 28
Por: MANUEL ALVES FILHO
Jornal da Unicamp

A Unicamp assina no dia 28 de maio contrato de licenciamento de tecnologia com a Incrementha PD&I (Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação). Pelo acordo, cuja duração coincide com o período de validade da patente (20 anos), a empresa da área farmacêutica terá direito de explorar comercialmente, com exclusividade, um colírio produzido à base de insulina. É a primeira parceria do gênero firmada entre a Unicamp e uma corporação privada no contexto da nova Lei de Inovação. O medicamento foi desenvolvido pelo oftalmologista Eduardo Melani Rocha, sob a orientação do professor Lício Velloso, da Faculdade de Ciências Médicas (FCM) da Universidade. O remédio deve ser indicado para o tratamento de lesões oculares e também da síndrome do olho seco. Caso as pesquisas finais apresentem resultados positivos, a expectativa é que o produto chegue ao mercado num prazo máximo de cinco anos. A empresa pagará royalties de 4% à Unicamp, até o limite de R$ 15 milhões de faturamento ao ano. Acima desse valor, o índice cairá para 2%.

“Remédio é indicado para síndrome do olho seco"
O depósito da patente do colírio foi protocolado pela Unicamp em 2004. As pesquisas em torno do medicamento começaram a ser desenvolvidas quatro anos antes, quando Eduardo Rocha fazia o curso de doutorado na Unicamp. Atualmente, ele é docente do Departamento de Oftalmologia, Otorrinolaringologia e Cirurgia de Cabeça e Pescoço da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (FMRP), vinculada à Universidade de São Paulo (USP).

Conforme Lício Velloso, embora a insulina tenha largo uso terapêutico, como no tratamento do diabetes, até o início dos estudos de seu ex-orientado a Medicina tinha poucas informações sobre os possíveis efeitos desse hormônio no olho humano. Entretanto, o que se sabia sobre a substância já fornecia pistas importantes para esclarecer essa questão.

Eduardo Rocha conta que a ação dos hormônios nos tecidos oculares sempre esteve entre os temas de suas pesquisas. Daí o natural interesse pela insulina. A substância, explica ele, promove a regulação de alguns fenômenos metabólicos, cumprindo também um importante papel na nutrição das células. Restava saber, porém, se ela estava presente nos tecidos oculares e que função desempenharia em relação a eles.
Para responder a essas perguntas, o pesquisador recorreu ao Departamento de Fisiologia e Biofísica do Instituto de Biologia (IB) da própria Unicamp. Lá, os cientistas desenvolveram métodos para isolar os tecidos oculares, com o objetivo de verificar como o hormônio chegava até eles. Caso a insulina fosse identificada, seria uma evidência de que fora transportada pelas lágrimas. “De fato, nós localizamos nos tecidos oculares receptores específicos para o hormônio, o que indicava a sua ação no local”, afirma Eduardo Rocha.

A partir desse dado, o pesquisador considerou que a substância poderia passar a integrar a composição de um colírio, que seria destinado ao tratamento de pessoas que apresentassem lesões oculares ou deficiência de lágrima. A proposta era que o remédio estimulasse tanto a cicatrização quanto a produção de fluido lacrimal por parte dos tecidos oculares. Nos ensaios realizados com modelos animais, a administração da insulina apresentou bons resultados.Ocorre, porém, que os olhos dos animais são muito diferentes dos olhos humanos. Normalmente, são mais resistentes.

A partir da assinatura do contrato de licenciamento com a Incrementha PD&I, novos estudos serão realizados, dessa vez com o medicamento propriamente dito. Estes prevêem testes clínicos em humanos. Nesse caso, o protocolo de pesquisa é bastante rigoroso, de modo a salvaguardar a saúde dos voluntários e a garantir a segurança e a eficácia do medicamento. “Nosso desafio é chegar a uma formulação que seja ótima”, destacou Lício Velloso.

O docente da FCM afirma que existe a hipótese, ainda, de as pesquisas apontarem para a necessidade da definição de formulações diferentes do colírio, cada uma indicada para um tipo específico de enfermidade. As investigações que serão realizadas com a participação da Incrementa PD&I, prossegue Lício Velloso, deverão cumprir quatro etapas. Numa delas, o medicamento será avaliado em indivíduos sadios, para checar o seu possível efeito tóxico. Noutra, o colírio será usado por um grupo reduzido de pessoas que apresentam doenças oculares.

O objetivo é verificar se ele produz efeito positivo em pacientes selecionados. Em seguida, o mesmo teste será expandido para grupos maiores de voluntários, inclusive com a participação de outras universidades e institutos de pesquisa. Nesse caso, a finalidade é conferir se os resultados se repetem ou não de forma homogênea. A última fase compreende a preparação do produto para ser finalmente colocado no mercado. “Se tudo correr dentro do esperado, acredito que em cinco anos o colírio já estará sendo vendido comercialmente”, estima Eduardo Rocha.

Olho seco - Uma das possíveis aplicações do colírio desenvolvimento pelos pesquisadores da Unicamp, como já foi dito, é no tratamento da síndrome do olho seco. O problema atinge entre 2% e 15% da população, variando conforme as condições ambientais e a presença de doenças sistêmicas, como o reumatismo. Eduardo Rocha e Lício Velloso lembram que, além de incomodar, a deficiência de lágrima pode ocasionar outras complicações.

O líquido é responsável, por exemplo, pelo transporte de células que atuam na defesa dos olhos contra as agressões do ambiente. “Além disso, se a lubrificação do olho não for adequada, o contínuo atrito entre os tecidos oculares pode ocasionar lesões importantes”, assinala Lício Velloso. “O olho seco severo pode levar até mesmo à perda da visão”, acrescenta Eduardo Rocha.

De acordo com ambos, o licenciamento do medicamento só foi possível graças ao trabalho da Agência de Inovação da Unicamp (Inova Unicamp), que fez a ponte entre a Universidade e o segmento produtivo.

Inrementha surgiu de parceria de laboratório
A Incrementha PD&I (Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação) foi constituída em 2006 a partir da parceria entre dois grandes laboratórios brasileiros: Biolab Sanus Farmacêutica Ltda. e Eurofarma Laboratórios Ltda. Trata-se de uma empresa independente, voltada ao desenvolvimento de novos produtos e plataformas tecnológicas na área farmacêutica. Seus laboratórios estão abrigados no Centro Incubador de Empresas Tecnológicas (Cietec), localizado na Universidade de São Paulo (USP).Dois tipos de inovação interessam diretamente à Incrementha PD&I: a incremental, que consiste no aperfeiçoamento de uma droga já conhecida, e a radical, que implica na criação de novas moléculas.

Tanto Biolab quanto Eurofarma investem juntos cerca de 8% de seu faturamento em pesquisas e desenvolvimentos, percentual que está dentro dos padrões internacionais, que variam de 6% a 20%. Somados, os dois laboratórios respondem por aproximadamente 6% do mercado nacional, com faturamento na casa de R$ 1,3 bilhão ao ano. Com as atividades da Incrementha PD&I, a expectativa é ampliar essa fatia para 8% do mercado nos próximos cinco anos. Em abril último, a Incrementha PD&I anunciou o lançamento do primeiro nanofármaco desenvolvido no Brasil. O produto, uma pomada anestésica de uso tópico, tem como objetivo substituir anestesias injetáveis quando da execução de pequenas cirurgias na pele.

A expectativa é que o anestésico passe a ser vendido comercialmente em 2008. O medicamento, desenvolvido com o suporte da nanotecnologia, foi concebido em conjunto com a Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), por meio de uma parceria que contou com o apoio do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), órgão do Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT).

Sem similares no mundo, de acordo com informações da empresa, o anestésico apresenta como benefícios a diminuição da dose recomendada, maior rapidez de ação e aumento e prolongamento dos efeitos terapêuticos. O produto, completa a Incrementha, já teve a patente depositada e tem seus testes desenvolvidos de acordo com os padrões das principais entidades regulatórias mundiais do setor, a saber: Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), European Medicines Agency (Emea) e Food and Drug Administration (FDA).

*Reportagem originalmente publicada no Jornal da Unicamp, Edição 360 - 28 de maio a 10 de junho de 2007. http://www.unicamp.br/unicamp/unicamp_hoje/ju/maio2007/ju360pag03.html

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